Há fundamentalmente duas maneiras de ler.
Uma consiste em “só” ler, ou seja, ler sem anotar, sem analisar explicitamente a construção do texto, os argumentos, certas estruturas etc. Um exemplo pode ser a leitura típica que fazemos de romances, de jornais, das revistas semanais. 
Do romance queremos acompanhar a intriga, o destino das personagens, queremos saber como termina. 
Nos jornais e nas revistas semanais buscamos as notícias, uma análise da semana “do governo”, uma avaliação de alguns fatos relevantes. Em nenhum desses casos nos detemos em analisar detalhes.
Mas se, por exemplo, lemos dois jornais ou duas revistas, é possível que nos demos conta de que o “mesmo fato” é tratado de maneira diferente. 
Se lemos dois colunistas que comentam uma questão mais “profunda” (a questão energética, o julgamento do “mensalão”, a reeleição de Obama), logo percebemos que aquilo que um aprova é desaprovado pelo outro. O mesmo efeito, embora um pouco mais raso, pode ser obtido lendo um jornal e assistindo a outro na tevê. Pode ser que digamos “tudo é política”, o que é a percepção da impossibilidade de um jornal ou colunista dar conta de tudo ou não tomar posição.

A outra forma de leitura é a que analisa. O foco pode ser um aspecto da construção (uma cadeia anafórica “ideológica”: os jovens... os bandidos... os marginais...), uma forma de designação (Elisa Samúdio é ex-amante e Bruno é ex-goleiro?), uma citação, uma alusão.

Num romance, pode chamar a atenção o narrador ser onisciente ou não, e as consequências desse fato. Um exemplo famoso é Dom Casmurro: Bentinho não sabe o que faz Capitu, pelo simples fato de que é ele quem narra e, portanto, não vê tudo. Até por isso nem vale a pena perguntar se a heroína o traiu ou não.

Também se pode considerar se o romance segue uma cronologia ou não. Grande Sertão: Veredas começa com Riobaldo já velho contando sua vida ao doutor; o tempo vai e vem: nem é uma retrospectiva pura nem uma retomada cronológica. No interior do romance, há um conjunto de histórias quase autônomas, como observou Walnice Nogueira Galvão. Willi Bolle sugere que o romance seja lido ao lado de Os Sertões, de Casa-Grande e Senzala etc. 
Ou seja, como um livro sobre a formação do Brasil.

O que a escola pode fazer? Uma possível resposta: fundamentalmente, deve criar leitores, o que exige tornar o primeiro tipo de leitura uma rotina. 
O projeto da escola deveria ser que os alunos lidassem com a escrita como lidam com a fala, isto é, o tempo todo e como algo natural (ambas as modalidades são cheias de regras que, no entanto, se dominam intuitivamente – por impregnação, no termo feliz de Maingueneau).

Aos poucos, mais chamando atenção aos fatos do que aplicando conceitos, desenvolve-se uma capacidade de observação da forma dos textos, das filiações dos autores, das escolas, dos tipos de jornal e revista.

A escola tem 12 anos para fazer isso antes que o aluno chegue à universidade.